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Natal

O ano está quase no fim. André pensa em fumar um cigarro na janela, olhando o trânsito das pessoas em busca das ofertas do dia após o natal, mas ele não fuma, sequer tem cigarros em casa, embora mantenha sempre um isqueiro por perto. Sentado na cama ele apenas observa através da vidraça uma nuvem um pouco amarelada que se arrasta vagarosamente no céu de fim de tarde. Cretina, como pode fazer isso comigo.

Naquela manhã de calor infernal, a única coisa que passava por sua cabeça era um chá gelado. Com limão. Por que tudo com limão é melhor? Limão é o bacon das bebidas. Jéssica tentava em vão passar pelas pessoas que se esfregavam umas às outras para conseguir chegar às bancas em promoção. Ela odiava aquele tumulto, mas precisava de um vestido novo, pois seu preferido havia manchado de uma maneira sem recuperação. A viagem estava marcada e logo menos seu novo caso a estaria esperando na porta de sua casa. É sempre assim no começo, os homens são irritantemente cordiais. A ajudaria carregar as sacolas, abriria a porta para ela, mentiria sobre não ter esperado muito.
André havia feito todas essas coisas também.

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